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Estados e arbitragem nacional e internacional / Capacidade dos Estados e das pessoas colectivas de direito público em se comprometerem

  • 13/01/2015
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O vosso site www.ohada.com publicou a 27 de Dezembro de 2014 um boletim informativo intitulado “Os grandes perigos de arbitragem para os Estados / Recomendações do site www.ohada.com para os Estados”, publicado no conjunto dos idiomas oficiais dos Estados OHADA.

Diversos internautas acolheram positivamente este boletim informativo que visava recordar os riscos deste modo privado de resolução de litígios que é a arbitragem para os Estados, à luz das pesadas condenações recentes. Por outro lado, em caso de contencioso arbitral que envolva um Estado, o boletim informativo salientava a importância da escolha da personalidade dos árbitros e recomendava, no caso das arbitragens da OHADA, que fosse solicitada a nomeação do terceiro árbitro, Presidente do tribunal arbitral, pelo CCJA da OHADA.

Outros internautas, muitas vezes oriundos das Ordens dos Advogados, mostraram-se surpresos com uma posição que consideraram demasiado restritiva e contrária a uma evolução geral favorável à arbitragem, fomentada na sua filosofia pela reforma da OHADA, que, como tinha inclusive sido lembrado no boletim informativo, abriu a idade de ouro da arbitragem em África.

Alguns desejaram finalmente ver o site www.ohada.com fazer um esclarecimento de direito comparado sobre a questão da “arbitrabilidade subjetiva” em matéria de arbitragem, no domínio da capacidade dos Estados de se comprometerem.

É para responder a este último desejo que o vosso site www.ohada.com vos apresenta os elementos de informação (de direito comparado) acima sobre a capacidades dos Estados, e mais genericamente das pessoas colectivas de direito público, em se comprometerem no caso de França (1) e dos Estados Unidos da América e da Inglaterra (2).

1. FRANÇA

(1a) Arbitragem interna

Tal como foi realçado no boletim informativo de 27 de Dezembro de 2014, o direito francês estabelece um princípio de proibição feito às pessoas colectivas de direito público de se comprometerem. O artigo 2060 do Código Civil estabelece com efeito que:

“Não se podem comprometer (...) nas contestações que interessem às pessoas colectivas públicas e às instituições públicas e mais genericamente em todas as matérias que interessem à ordem pública.

No entanto, as categorias de instituições públicas de carácter industrial e comercial podem ser autorizadas por decreto a se comprometerem.”

O princípio segundo o qual o Estado não se pode comprometer em matéria de arbitragem interna foi consagrado pela jurisprudência. No parecer de princípio Eurodisneyland datado de 6 de Março de 1986, o Conselho de Estado (Conseil d'Etat) esclareceu deste modo:

“As pessoas colectivas de direito público não podem subtrair-se às regras que determinam a competência das jurisdições nacionais remetendo para a decisão de um árbitro a solução de litígios dos quais fazem parte e que se referem a relações relevantes de ordem jurídica interna.”

As excepções à regra segundo a qual o Estado não se pode comprometer são enumeradas no Artigo L. 311-6 do Código de Justiça Administrativa. Trata-se, entre outras, das situações seguintes:

  • Determinadas categorias de instituições públicas de carácter industrial e comercial (E.P.I.C.) estão autorizadas a comprometerem-se por Decreto (ver Artigo 2060 do Código Civil acima mencionado).
  • O Estado e as pessoas coletivas locais podem recorrer à arbitragem para os litígios com origem em matéria de trabalhos públicos e de contratos de fornecimento.
  • As instituições públicas de carácter científico e tecnológico podem recorrer à arbitragem nos casos de litígios com origem na execução de contratos de investigação realizados com organismos estrangeiros após aprovação pelo Conselho de Administração.
  • O Estado está autorizado a recorrer à arbitragem para pôr em prática o procedimento de retorno de um bem cultural desde que o proprietário, o possuidor ou o detentor tenha concordado.
  • A SNCF, a Rede dos Caminhos de Ferro de França e a La Poste estão autorizadas a comprometerem-se.

Estão igualmente previstas outras excepções pelo despacho n° 2004-559 de 17 de Junho de 2004 sobre os contratos de parceria públicoprivada.

O Artigo 9 da Lei 86-972 de 19 de Agosto de 1986 contém diversas disposições relativas às pessoas colectivas locais que autorizam, por derrogação do Artigo 2060 do Código Civil, o Estado, as pessoas colectivas territoriais e as instituições públicas a subscreverem cláusulas compromissórias nos contratos que celebram em conjunto com as empresas estrangeiras para a realização de operações de interesse nacional na busca de uma solução, se adequado, para os litígios associados à aplicação e interpretação destes contratos.

(1b) Arbitragem internacional

As restrições introduzidas em matéria de arbitragem interna na capacidade do Estados e das pessoas colectivas para se comprometerem são diferentes em matéria de arbitragem internacional. A decisão principal é a que foi tomada a 2 de Maio de 1966 no caso Galakis, em que o Tribunal de Segunda Instância (Cours de cassation) decidiu que a interdição existente do Estado se comprometer não era aplicável a “um contrato internacional celebrado para as necessidades e nas condições em conformidade com as práticas do comércio marítimo”.

A solução foi tomada regularmente desde então pela jurisprudência. Esta aplica-se, em matéria de arbitragem internacional, a todas as pessoas colectivas de direito público, francesas ou estrangeiras.

No entanto, deve ser realçado que as autoridades públicas francesas continuam muito prudentes e estão por princípio relutantes em comprometer o Estado na assinatura das cláusulas compromissórias.

Para mais informações sobre o direito francês que rege a capacidade do Estado em comprometer-se, ver o Memorando Prático Francis Lefebvre, Direito Comercial nos números 17212, 70760 a 70766 e 71323, Autor: Barthélémy MERCADAL.

(2) ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA E INGLATERRA

Sob reserva, não parecem existir, nos Estados Unidos da América ou em Inglaterra, normas que proíbam o Estado ou as pessoas colectivas de direito público de se comprometerem.

Nem a “Lei de Arbitragem Federal (Federal Arbitration Act)”, nem a “Lei de Arbitragem Inglesa (English Arbitration Act)” de 1996 incluem disposições sobre este assunto (ver Born, International Commercial Arbitration, Kluwer Law International 2014, p. 964-969).

Os Estados Unidos da América e a Inglaterra ratificaram, por outro lado, a Convenção CIRDI de 18 de Março de 1965, a qual manifesta que estes dois Estados admitem que os litígios que os põem em causa são arbitráveis (ver Fouchard, Gaillard, Goldman, Traité de l'arbitrage commercial international, Litec 1996, parág. 548, p. 339).

No entanto mantém-se a questão da “arbitrabilidade objectiva”, ou seja a que consiste em saber se determinado litígio ou determinada matéria podem ser objecto de uma processo arbitral no Estado em questão.

Em Inglaterra, por exemplo, os litígios abrangidos pelo direito penal, as questões associadas ao divórcio ou ao planeamento territorial, não são a priori arbitráveis (ver Dahlberg, Welsh, Arbitration Guide, IBA Arbitration Committee, Inglaterra e País de Gales, Abril 2012, p. 5).

Nos Estados Unidos da América, os tribunais americanos tendem a considerar que todos os litígios são arbitráveis excepto se uma lei federal não previr expressamente o contrário (ver Born, International Commercial Arbitration, Kluwer Law International 2014, p. 964 e seg.).

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O vosso site www.ohada.com espera que estes elementos coloquem em perspectiva as recomendações formuladas aos Estados no boletim informativo de 27 de Dezembro de 2014. Se é verdade que o recurso à arbitragem para as pessoa colectivas de direito público e/ou para os Estados tende a ser encontrado cada vez mais nos diferentes países do mundo, os responsáveis dos Estados de África devem estar conscientes dos riscos incorridos pelos seus países assim que estes últimos se comprometerem com as cláusulas de arbitragem. De qualquer modo, impõem-se uma extrema vigilância em relação à escolha dos árbitros, os quais devem ser personalidades de primeiro plano que se tenham destacado de uma forma ou de outra ao serviço do continente.

Em concreto, quando com conhecimento de causa e depois de terem avaliado os riscos, os Estados decidem comprometer-se com a arbitragem, estes devem na nossa opinião, privilegiar sistematicamente a arbitragem institucional sob a égide do Tribunal Comum de Justiça e de Arbitragem (Cour Commune de Justice et d'Arbitrage) da OHADA. Tal permite-lhes preservar no mínimo os interesses do seu país graças às salvaguardas instituídas pelo legislador OHADA.

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